quinta-feira, 18 de agosto de 2022

Projeto de Lei nº73/2022 - Identidade de Gênero População LGBTQIAP+


Este Projeto de Lei tem como objeto a inclusão de dois quesitos de perguntas a serem incluídas em todos os sistemas de informação, avaliação, monitoramento, coleta de dados, censos e programas. E tem como o objetivo identificar o perfil das pessoas, bem como mapear e cadastrar o referido perfil com vistas ao direcionamento das políticas públicas voltadas a atender às necessidades da população LGBTQIAP+.

Os dois quesitos de perguntas inseridos nos formulários do poder público municipal versam sobre dois conceitos oriundos de pesquisas acadêmicas internacionais, acionados por movimentos de direitos LGBTQIAP+ e legitimados pela Organização das Nações Unidas (ONU): orientação sexual e identidade de gênero. A base conceitual para os quesitos foi retirada do documento intitulado Princípios de Yogyakarta, documento desenvolvido por inúmeras instituições internacionais e universidades de prestígio e ratificado na Universidade Gadjah Mada, em Yogyakarta, Indonésia. Na introdução do documento existe uma apresentação com as bases conceituais supracitadas nos seguintes pontos:

Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Todos os direitos humanos são universais, interdependentes, indivisíveis e inter-relacionados. A orientação sexual¹ e a identidade de gênero² são essenciais para a dignidade e humanidade de cada pessoa e não devem ser motivo de discriminação ou abuso. Muitos avanços já foram conseguidos no sentido de assegurar que as pessoas de todas as orientações sexuais e identidades de gênero possam viver com a mesma dignidade e respeito a que todas as pessoas têm direito. Atualmente, muitos Estados possuem leis e constituições que garantem os direitos de igualdade e não-discriminação, sem distinção por motivo de sexo, orientação sexual ou identidade de gênero. Entretanto, violações de direitos humanos que atingem pessoas por causa de sua orientação sexual ou identidade de gênero, real ou percebida, constituem um padrão global e consolidado, que causa sérias preocupações.

(...)

A Comissão Internacional de Juristas e o Serviço Internacional de Direitos Humanos, em nome de uma coalizão de organizações de direitos humanos, realizaram um projeto com o objetivo de desenvolver um conjunto de princípios jurídicos internacionais sobre a aplicação da legislação internacional às violações de direitos humanos com base na orientação sexual e identidade de gênero, no sentido de dar mais clareza e coerência às obrigações de direitos humanos dos Estados. Um grupo eminente de especialistas em direitos humanos preparou um documento preliminar, desenvolveu, discutiu e refinou esses Princípios. Depois de uma reunião de especialistas, realizada na Universidade Gadjah Mada, em Yogyakarta, Indonésia, entre 6 e 9 de novembro de 2006, vinte e nove eminentes especialistas de 25 países, com experiências diversas e conhecimento relevante das questões da legislação de direitos humanos, adotaram por unanimidade os Princípios de Yogyakarta sobre a Aplicação da Legislação Internacional de Direitos Humanos em relação à Orientação Sexual e Identidade de Gênero. (...) Os Princípios de Yogyakarta tratam de um amplo espectro de normas de direitos humanos e de sua aplicação a questões de orientação sexual e identidade de gênero. Os Princípios afirmam a obrigação primária dos Estados de implementarem os direitos humanos.

(...)

1) Compreendemos orientação sexual como uma referência à capacidade de cada pessoa de ter uma profunda atração emocional, afetiva ou sexual por indivíduos de gênero diferente, do mesmo gênero ou de mais de um gênero, assim como ter relações íntimas e sexuais com essas pessoas.

2) Compreendemos identidade de gênero a profundamente sentida experiência interna e individual do gênero de cada pessoa, que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento, incluindo o senso pessoal do corpo (que pode envolver, por livre escolha, modifi cação da aparência ou função corporal por meios médicos, cirúrgicos ou outros) e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta, modo de falar e maneirismos. (PRINCÍPIOS, 2006. Grifo nosso).

Em nível internacional, tanto a Organização das Nações Unidas (ONU) quanto a Organização dos Estados Americanos (OEA) têm aprovado declarações e resoluções afirmando que a orientação sexual e a identidade de gênero também devem ser consideradas como direitos humanos. Em 2012 o Escritório do Alto Comissariado das Nações para os Direitos Humanos lançou uma publicação intitulada “Nascidos livres e iguais: orientação sexual e identidade de gênero no regime internacional de direitos humanos”. Além disso, em 09 de janeiro de 2018, a OEA publicou oficialmente a Opinião Consultiva n° 24/17, a qual consolida o reconhecimento do casamento civil igualitário para parceiros de mesmo sexo nas Américas, bem como a possibilidade de retificação de nome civil e redesignativo de sexo/gênero sem cirurgia de transgenitalização. Os Estados-membros da OEA que ratificaram a Convenção Americana de Direitos Humanos, como o Brasil, terão a obrigação de adequar sua legislação interna aos parâmetros internacionais. “A violência e discriminação contra as pessoas LGBTI+ são ‘uma monumental tragédia para os que se preocupam e uma mancha na nossa consciência coletiva’ (Ban Ki-moon, Secretário Geral das Nações Unidas)” (UNHCHR, 2013).

Portanto, este Projeto de Lei tem como foco principal criar um sistema mínimo de dados municipais, relativos à população LGBTQIAP+, para que o Poder Público Municipal, pesquisadores científicos e munícipes possam analisar e desenvolver ações em prol de políticas públicas e pesquisas voltadas à população LGBTQIAP+. Hoje, o Município de Ribeirão Preto não possui uma base de dados com tais informações, fato que prejudica a produção de políticas públicas setoriais, como na saúde, na assistência social e na educação em relação à comunidade LGBTQIAP+.

Importante frisar que este Projeto de Lei possui inspiração na Lei Municipal 14.607 de 2021 que “Dispõe sobre a inclusão do quesito raça/cor, nos formulários e sistemas de informação no âmbito da administração pública de Ribeirão Preto”, promulgada pelo Poder Executivo sem vetos, haja vista que não gerou gastos à Prefeitura tampouco foi considerada inconstitucional. Outro importante ponto é que este Projeto de Lei será oficiado ao Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual (CMADS) de Ribeirão Preto a fim de que o Conselho possa analisar, criticar e contribuir para o aprimoramento deste PL.



PROJETO DE LEI

D E S P A C H O



Nº 73/2022

EMENTA:  

DISPÕE SOBRE A INCLUSÃO DOS QUESITOS ORIENTAÇÃO SEXUAL E IDENTIDADE DE GÊNERO NOS FORMULÁRIOS E SISTEMAS DE INFORMAÇÃO DE RIBEIRÃO PRETO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.


SENHOR PRESIDENTE 

Apresentamos à consideração da Casa o seguinte:

Art. 1º - Deverá ser incluído nos formulários da Administração Direta e Administração Indireta, no âmbito do Município de Ribeirão Preto, os quesitos orientação sexual e identidade de gênero em todos os sistemas de informação, avaliação, monitoramento, coleta de dados, censos e programas com o objetivo de identificar o perfil das pessoas, bem como de mapear e cadastrar o referido perfil com vistas ao direcionamento das políticas públicas voltadas a atender às necessidades da população LGBTQIAP+.

Parágrafo único. Para efeitos desta Lei, entende-se: 

I - orientação sexual é a inclinação involuntária de cada pessoa em sentir atração sexual, afetiva e emocional por indivíduos de gênero diferente, de mais de um gênero ou do mesmo gênero.

II - identidade de gênero é uma experiência interna e individual do gênero de cada pessoa, que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento, incluindo o senso pessoal do corpo que pode envolver, por livre escolha, modificação da aparência ou função corporal por meios médicos, cirúrgicos e outros, e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta, modo de falar e maneirismos. 

Art. 2º As informações e os indicadores tratados no art. 1º poderão ser disponibilizados nos portais dos órgãos da Administração Direta e da Administração Indireta e no portal da Prefeitura Municipal.

§ 1º  A divulgação das informações e indicadores deverá resguardar a intimidade e os direitos da personalidade, ficando vedado seu uso para fins diversos daqueles previstos nesta Lei. 

§ 2º A divulgação das informações e indicadores deverá respeitar a Lei Federal nº 13.709 de 2018 - Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

Art. 3º Caberá aos órgãos da Administração Direta e da Administração Indireta, em articulação com as Secretarias responsáveis pelas políticas voltadas à população LGBTQIAP+, a edição de outros atos necessários à orientação e operacionalização da inclusão dos quesitos orientação sexual e identidade de gênero nos formulários, sistemas de informação, avaliação, monitoramento, coleta de dados, censos, programas e ações em âmbito municipal.

Parágrafo Único. O Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual (CMADS) de Ribeirão Preto, ou o Conselho que vier a substituí-lo, poderá ser consultado para aprimorar e efetivar os objetivos previstos neste artigo.

Art. 4º O Poder Executivo deverá se responsabilizar pela capacitação dos profissionais, visando à sua orientação para a coleta adequada dos dados e adequação dos formulários e sistemas de informação de Ribeirão Preto, em articulação e com o apoio das Secretarias responsáveis pelas políticas voltadas à população LGBTQIAP+.

Parágrafo único. Os órgãos públicos deverão respeitar a Lei Municipal nº 13.254 de 2014 no tratamento nominal das pessoas transexuais e travestis nos objetivos previstos neste artigo. 

Art. 5º As ações do Poder Executivo destinadas à efetivação da implantação dos quesitos orientação sexual e identidade de gênero poderão ser objeto de consultas públicas e outros instrumentos de participação social. 

Art. 6º O Poder Executivo poderá regulamentar esta lei para a sua efetiva aplicação. 

Art. 7º As despesas decorrentes da execução desta lei correrão por conta de dotações orçamentárias próprias, suplementadas, se necessário. 

Art. 8º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação. 

 

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Judeti Zilli

     Coletivo Popular Judeti Zilli 

Sala das Sessões 20 de março de 2022


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